domingo, 9 de dezembro de 2007

A CIRURGIA DO PUNHO


Por Paccelli José Maracci Zahler

Poucos meses depois de começar a ensaiar na banda do colégio Auxiliadora, meus punhos começaram a doer. Até então eu não sabia a causa, mas percebi que começaram a se formar cistos nas articulações com as mãos.
Eu sofria mais no inverno, onde o frio e a umidade pioravam o problema. Era duro agüentar fazer os exercícios das aulas de Educação Física do Prof. Paulo, particularmente, aquelas que envolviam apoios sobre o solo. Para mim, era uma tortura fazê-los porque os punhos doíam muito. Como eu tinha que obter notas para passar de ano, não podia reclamar. Se reclamasse durante as aulas, poderia receber um castigo, como mais dez apoios sobre o solo, dez pulinhos de galo e assim por diante.
Passei a usar esparadrapos ao redor dos punhos. Sinceramente, eu me sentia ridículo, mas as ataduras de esparadrapo me aliviavam um pouco a dor.
O tempo passou e, quando entrei no Científico, as aulas de Educação Física foram substituídas por partidas de futebol, exceção feita às provas mensais que incluíam o teste de Cooper.
Nas partidas de futebol, como eu não conseguia jogar em nenhuma posição no campo por ser um perna-de-pau autêntico, então, fui escolhido goleiro, como todo perna-de-pau que se preze. Até que conseguia ‘enganar’ a torcida, mas os punhos doíam demais para pegar a bola.
O problema se agravou de tal maneira que, em 1975, tive que largar a banda. O Padre Lino veio me tirar satisfações porque eu estava na banda desde 1971. Eu expliquei o problema e ele classificou como ‘frescura’.
Fui ao médico e ele me disse que eu teria que fazer uma punção porque, possivelmente, se tratasse de um cisto aquoso. Mandou-me esperá-lo em uma sala de cirurgia, enquanto a enfermeira preparava o material.
Comecei a ficar nervoso, a me perguntar se aquilo era realmente necessário e, sem falar nada, fui embora para casa.
Algum tempo depois, consultei outro médico no mesmo hospital. Ele foi mais rápido. Quando dei por mim, estava na sala de cirurgia operando o punho esquerdo, exatamente o da mão que eu utilizava para escrever.
Como fui tomado de surpresa e a anestesia tinha sido local, quase desmaiei umas três vezes durante o procedimento médico e nem me lembrei de pedir um atestado.
No dia seguinte, com a mão enfaixada e com pontos no punho, fui ter com o padre conselheiro para explicar as razões de eu não ter ido à manhã de formação do dia anterior, cuja presença era obrigatória.
Eu me lembro das feições do padre. Ele usava costeletas, tinha os olhos azuis e era um pianista talentoso. Não me lembro do nome dele.
Quando expliquei para ele o que havia acontecido, ele me deixou subindo pelas paredes de raiva porque começou a insinuar que eu havia faltado a aula por motivos pessoais, que tinha enfaixado a mão para disfarçar, fingir, tentar sensibilizá-lo e convencê-lo a não me dar a falta.
Eu discuti feio com ele. Para mim foi uma tremenda ofensa. Entretanto, tive que dar um jeito de voltar ao hospital, entrar em contato com o médico para obter o atestado, do contrário, perderia pontos com a falta na manhã de formação.
Passado o estresse, eu já estava me preparando para a cirurgia do punho direito, porém, uma coisa incrível aconteceu. Não sei se foi por medo ou o susto, mas o cisto do punho direito sumiu por 32 anos.
No ano passado, devido à prática da natação, os cistos voltaram nos dois punhos. Imediatamente, eu me lembrei da cirurgia e do padre conselheiro.
Desta vez, contando com mais recursos, fiz ecografia dos punhos, atestando a presença de cistos aquosos.
O médico me receitou anti-inflamatórios e fisioterapia e me aconselhou a esperar mais um pouco antes de me submeter à nova cirurgia.
Impedido de praticar natação com freqüência devido às dores, passei a fazer exercícios de musculação. Como por milagre, as dores cessaram. Isso me levou a concluir que o problema era a falta de tonificação dos tendões, os quais passaram a doer devido ao esforço repetitivo das baquetas no tarol e, posteriormente, devido ao movimento rotativo dos braços durante a natação.
Se, 32 anos atrás, as aulas de Educação Física fossem voltadas para a tonificação do corpo, a cirurgia não teria sido necessária, mas o Prof. Paulo se esmerava em nos tratar como soldados, aplicando exercícios de quartel.
Uma de suas características era nos dar exercícios puxados depois da volta das férias de verão. Passávamos até duas semanas com dores musculares e ele parecia se divertir com isso.

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