sexta-feira, 10 de agosto de 2007

A ORIGEM DO JORNAL "FOFOCAS"


Por Sergio Fontana
“Qual dos gráficos abaixo melhor representa o Movimento Retilíneo Uniformemente Variado?”. Uma pergunta como esta, seguida de quatro alternativas, de “a” a “d”, cada uma delas apresentada em forma de gráfico do tipo “velocidade x tempo”, “velocidade x distância” ou “distância x tempo”, e mais a alternativa “e”, que continha, invariavelmente, a palavra “nenhum”, era o estilo favorito do Professor Gesner Carvalho quando aplicava uma de suas provas-relâmpago de Física, no 1º Científico.
Inicialmente, essas avaliações se resumiam a, somente, duas questões, ambas semelhantes ao supracitado exemplo e que valiam cinco pontos, cada uma.
Para quem estava “por dentro” da matéria, era fácil alcançar o “10”; mas para os outros - e o meu caso se enquadrava aí - era nota “5” ou “zero”.
Uma coleção de “cincos” ou “zeros” nas duas ou três avaliações mensais desse tipo que ele fazia, resultava em desastre certo no final do mês.
Desenvolvi, em função dos pequenos fracassos nessas provinhas, uma fobia doentia a essa disciplina, e cada vez menos entendia as explicações do professor.
Aos trancos e barrancos compensava essas limitações, gastando mais horas por dia, em casa, na tentativa de assimilar as lições através do livro didático e do que conseguia copiar na aula.
Foi involuntária a criação da fórmula que me ajudou a superar o trauma e a desconfiança relacionados ao Professor Gesner, e vou contar, a seguir, como foi.
A primeira vez que eu vi uma charge do Falcão não tive dúvidas de que ele era uma estrela de primeira grandeza, um desenhista nato com personalidade de diretor de cinema francês. E me inspirei naquela capacidade rara para tentar aperfeiçoar o meu modo de desenhar.
Acompanhar com atenção o desenvolvimento das criações dele era fácil para mim porque o meu assento, na sala de aula de um certo ano letivo, era o quarto da primeira coluna à esquerda, e o dele era o terceiro da segunda coluna, também à esquerda, ou seja, uma vista diagonal favorável me permitia observar a performance do desenhista.
Assim, fui pegando gosto pela coisa, arriscando desenhar umas caricaturas com olhos, nariz e boca exageradamente deformados e, ao mesmo tempo, prestando mais atenção nas charges do Santiago e do Sam Paulo que desenhavam para a Folha da Manhã, e nas tiras de “Hagar, O Horrível”, que até hoje saem na Zero Hora.
Eu tinha um amigo, o Dario Caneda Teixeira, que também gostava de desenhar, e algumas tardes de folga eram gastas na “produção” de mini-estórias em quadrinhos em uma peça dos fundos da minha casa.
No colégio, já no 2º ano Científico, invocando as lembranças de umas estórias proibidas do “Zorro”, criadas e desenhadas pelo Paccelli nos tempos de ginásio, as quais circulavam com aprovação unânime por toda sala de aula, imaginei que desenhar e escrever estórias bem humoradas era divertido; e reproduzir situações reais ou imaginárias isoladas dos colegas mais chegados também era divertido; mas transmitir, em forma de notícia, várias ocorrências internas, reais ou imaginárias, e ainda por cima, “fotografá-las” poderia ser mais interessante.
Não seriam tão bem retratadas as imagens, uma vez que o verdadeiro especialista em desenho era o nosso colega Cláudio, mas o propósito principal da “coisa” era, pelo menos, dar uma idéia das cenas das ocorrências.
Uma folha de caderno dobrada ao meio se transformou em quatro páginas de jornal quando foi girada a 90 graus. Faltava dar um nome à criação.
Desenhei uns olhos, como se fossem os de um espião atento a tudo, um nariz comprido – como o meu - entre eles e a boca que era só um ponto mais abaixo.
O nome surgiu dali, daquele desenho, e também porque a característica principal do jornal era o sensacionalismo. Nem precisei pensar muito; a palavra estava “caindo de madura”: “FOFOCA”. Mas não ficou tão bem. Então, “FOFOCAS” - inicialmente sem as asinhas. Depois, como o jornal precisava estar bem informado para poder circular, o logotipo ganhou as tais asinhas para poder observar melhor os “deslizes” de todo mundo, ou seja, passou a ter uma visão aérea privilegiada.
O nosso professor Gesner gostava de andar, a passos lentos, dentro da sala de aula, especialmente quando propunha um problema por escrito aos seus alunos. Aguardava a solução, caminhando. Numa dessas andanças, descobriu um exemplar do “jornal” circulando e o pegou.
Todo o mundo ficou em silêncio e eu com medo da pergunta iminente:
- “Quem é que fez isto aqui?”
Mas não aconteceu nada, que eu me lembre. Ele leu, deu uma risada discreta e devolveu o exemplar do “jornal” ao colega que anteriormente estava com ele.
Num outro dia, para minha surpresa ainda maior, perguntou:
- “Já saiu o jornalzinho hoje?”
E todo mundo começou a rir. Na verdade, naquele dia, especificamente, eu não tinha pensado em nada para noticiar, mas diante da pergunta do homem, apressei-me em apurar as informações mais recentes, “fotografando-as” o mais rápido que eu podia.
Antes do fim da aula de Física o informativo aterrissou na mesa do mestre.

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